A previsão das férias remuneradas e a possibilidade de conversão de férias não usufruídas em dinheiro devem estar previstas em lei, necessariamente, em respeito ao princípio da legalidade. O gozo de férias anuais é decorrente de um direito social reconhecido a todos os trabalhadores, nos termos do disposto no parágrafo 4º do artigo 39 e do inciso XVII do artigo 7º da Constituição Federal.
Inclusive, há decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) quanto ao reconhecimento desse direito, em sede de repercussão geral – Recurso Extraordinário (RE) nº 650.898. Também confirmam esse entendimento as disposições do Acórdão nº 4529/17 – Tribunal Pleno do Tribunal de Contas do Estado do Paraná (TCE-PR).
A indenização de férias não usufruídas a prefeito somente será devida quando atendidas, cumulativamente, três condições. Não é necessário, contudo, a existência de lei prevendo expressamente o direito à indenização no caso de férias não gozadas, uma vez que se trata de direito decorrente do direito ao gozo de férias.
A primeira condição é a existência de legislação municipal que preveja o direito ao recebimento de férias anuais remuneradas e adicional de um terço aos gestores municipais, assim como viabilidade orçamentária e financeira para a sua concessão. Essa viabilidade deve levar em conta a realidade financeira do município; a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO); a Lei Orçamentária Anual (LOA); a Lei Complementar nº 101/00 (Lei de Responsabilidade Fiscal – LRF), notadamente seus artigos 16 e 17; e os limites do artigo 29-A e parágrafo 1º da Constituição Federal (CF/88).
A segunda é o gestor municipal ter concluído o mandato sem o gozo das férias, sendo que a indenização deverá ser recebida somente após o final do mandato. A terceira é o impedimento ao gozo das férias ter ocorrido em razão de necessidade da administração, de forma excepcional, devendo o gestor municipal colacionar documentos e justificativas à entidade administrativa que demonstrem a impossibilidade do usufruto do direito sem prejuízo à atividade e obrigações inerentes ao cargo.
A conversão em pecúnia do valor das férias vencidas e não gozadas no decorrer da legislatura referente aos períodos já vencidos é indevida, uma vez que as férias poderão ser usufruídas oportunamente, pois a indenização das férias vencidas e não usufruídas na atividade é devida somente após o término do mandato do gestor municipal. No caso de pagamento de indenização no decorrer do mandato, deve ser reconhecido como indevido o pagamento efetivado a esse título, impondo-se o ressarcimento de tais valores, com incidência de juros e correção monetária a partir da data do pagamento indevido.
Essa é a orientação do Pleno do TCE-PR, em resposta à Consulta formulada pelo Município de Wenceslau Braz (Região do Norte Pioneiro do Paraná), por meio da qual questionou sobre a admissibilidade de indenização de férias não gozadas a prefeito.
Instrução do processo
A Coordenadoria de Gestão Municipal (CGM) do TCE-PR opinou pela possibilidade do gozo e da indenização de férias acrescidos de terço constitucional ao prefeito, desde que haja previsão legal. Além disso, lembrou que a indenização só poderia ocorrer após o término ou afastamento do mandato.
O Ministério Público de Contas do Estado do Paraná (MPC-PR) entendeu pela possibilidade de conversão de férias em pecúnia de prefeito, ao final do mandato, desde que haja previsão legal sobre o tema e o beneficiário não mais possa fruir as férias oportunamente.
Legislação e jurisprudência
O inciso XVII do artigo 7º da CF/88 dispõe que é direito dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social, o gozo de férias anuais remuneradas com, pelo menos, um terço a mais do que o salário normal.
O artigo 29-A do texto constitucional expressa que o total da despesa do Poder Legislativo Municipal, incluídos os subsídios dos vereadores e excluídos os gastos com inativos, não poderá ultrapassar os percentuais fixados na CF/88, relativos ao somatório da receita tributária e das transferências previstas, efetivamente realizado no exercício anterior.
O parágrafo 1º desse artigo estabelece que a câmara municipal não pode gastará mais de 70% de sua receita com folha de pagamento, incluído o gasto com o subsídio de seus vereadores.
O artigo 37 da CF/88 estabelece que a administração pública direta e indireta de qualquer dos poderes da União, dos estados, do Distrito Federal e dos municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência.
O inciso X desse artigo expressa que a remuneração dos servidores públicos somente poderá ser fixada ou alterada por lei específica, observada a iniciativa privativa em cada caso, assegurada revisão geral anual, sempre na mesma data e sem distinção de índices.
O parágrafo 3º do artigo 39 do texto constitucional fixa que se aplica aos servidores ocupantes de cargo público o disposto no artigo 7º, incisos IV, VII, VIII, IX, XII, XIII, XV, XVI, XVII, XVIII, XIX, XX, XXII e XXX, podendo a lei estabelecer requisitos diferenciados de admissão quando a natureza do cargo o exigir.
O artigo 16 da LRF expressa que a criação, expansão ou aperfeiçoamento de ação governamental que acarrete aumento da despesa será acompanhado de estimativa do impacto orçamentário-financeiro no exercício em que deva entrar em vigor e nos dois subsequentes; e de declaração do ordenador da despesa de que o aumento tem adequação orçamentária e financeira com a LOA e compatibilidade com o plano plurianual e com LDO.
O artigo 17 da LRF considera obrigatória de caráter continuado a despesa corrente derivada de lei, medida provisória ou ato administrativo normativo que fixem para o ente a obrigação legal de sua execução por um período superior a dois exercícios.
Em decisão tomada no Recurso Extraordinário nº 650.898/RS, que versou sobre a concessão de 13º salário aos prefeitos e vice-prefeitos e possível confronto do direito a tais vantagens com o preceito do artigo 39, parágrafo 4º, da CF/88, o STF fixou a tese de repercussão geral segundo a qual o pagamento de terço de férias e 13º salário é compatível com o texto constitucional.
Quanto à possibilidade de pagamento de 13º subsídio a prefeitos, vice-prefeitos e vereadores, o Acórdão nº 4529/17 – Tribunal Pleno, em resposta a consultas, expressa que “não há na Constituição Federal um impeditivo para que a lei municipal institua as vantagens pecuniárias de 13º subsídio e adicional de férias, observados os demais requisitos de validade para tanto, notadamente a Lei Orgânica do Município”.
Além disso, estabelece que a previsão deve se dar, necessariamente, mediante a edição de lei específica, que fixe o valor dos subsídios; e que, por se tratar de instituição de despesa continuada, deve-se levar em conta a realidade financeira do município, a LDO, a LOA, a LRF e os limites do artigo 29-A e parágrafo 1º da Constituição Federal.
Essa decisão também estabelece que, conforme previsão expressa do artigo 29, V, da Constituição Federal, a iniciativa do projeto de lei que disponha sobre remuneração de prefeitos, vice-prefeitos e secretários municipais é exclusiva da câmara municipal.
Já o Acórdão nº 2989/19 – Tribunal Pleno do TCE-PR, em resposta a Consulta, dispõe que é possível o pagamento de 13º salário e abono de férias aos secretários municipais com base em lei municipal anterior à decisão constante do Acórdão 4529/17 – Tribunal Pleno.
O Acórdão nº 2045/20 – Tribunal Pleno do TCE-PR (Consulta nº 903750/17) estabelece que é possível a concessão de décimo terceiro subsídio para prefeitos, vice-prefeitos e secretários municipais no curso da legislatura, observado o princípio da reserva legal, conforme disposição do artigo 29, V, da Constituição Federal (CF/88) e do artigo 16, VI, da Constituição do Estado do Paraná; e de acordo com decisão do STF no Recurso Extraordinário (RE) nº 650.898.
Esse acórdão menciona que, inclusive, em decisão expressa no Acórdão nº 4528/17 – Tribunal Pleno, referente a Consulta com efeitos normativo e vinculante, o TCE-PR já havia adotado o entendimento fixado no RE nº 650.898 do STF. Assim, o princípio da anterioridade é aplicável apenas à instituição dos subsídios de vereadores, conforme disposto no artigo 29, VI, da CF/88.
Ainda de acordo com essa decisão, a fixação legal da possiblidade de pagamento de 13º subsídio a agentes políticos somente pode alcançar situações futuras, em respeito aos princípios da segurança jurídica, do interesse social e da boa-fé. Portanto, é vedada a aplicação retroativa da lei que venha a ser editada nesse sentido.
O Acórdão nº 2045/20 – Tribunal Pleno dispõe, ainda, que o início da vigência da lei que prevê o pagamento do 13º corresponde ao marco temporal normativo a partir do qual tal vantagem poderá ser paga. Além disso, a lei que fixar o benefício deve atender todas as condições para sua validade: a previsão da despesa na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), na Lei Orçamentária Anual (LOA), o atendimento
às disposições dos artigos 16 e 17 da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) e o respeito aos limites do artigo 29-A e parágrafo 1º da CF/88.
Esse acórdão fixa, ainda, que as disposições do Acórdão nº 4529/17 – Tribunal Pleno do TCE-PR são aplicáveis em sua plenitude aos secretários municipais. Tal decisão define que, conforme previsão expressa do artigo 29, V, da CF/88, a iniciativa do projeto de lei que disponha sobre remuneração de prefeitos, vice-prefeitos e secretários municipais é exclusiva da câmara municipal.
A última disposição desse acórdão é que secretários municipais detentores de cargo efetivo e licenciados que tenham optado pelo subsídio do cargo de secretário somente terão direito a receber o 13º subsídio se houver previsão legal quanto à possibilidade do recebimento dessa vantagem, expressa na lei específica que fixa os subsídios aplicáveis.
O artigo 11 da Instrução Normativa (IN) nº 72/12 do TCE-PR estabelece que o prefeito e o vice-prefeito que tenham optado pelo regime remuneratório do cargo político não farão jus ao recebimento de 13º salário e ao abono de férias, vantagens que se aplicam apenas aos subsídios dos secretários municipais.
Em resposta à Consulta nº 07582/18, o Tribunal de Contas dos Municípios do Estado de Goiás (TCM-GO) manifestou-se no sentido de que a conversão do período de fruição das férias do prefeito em pecúnia exige previsão em lei que expressamente preveja esse direito aos agentes políticos.
Essa resposta também estabelece que a norma que prever a conversão de férias em pecúnia deve limitar o número de dias em que será possível essa conversão, utilizando como parâmetro as normas de direito internacional e de direito privado. Além disso, expressa que a indenização das férias vencidas e não gozadas pelos prefeitos deve ocorrer somente após término do mandato e no caso de o motivo do não exercício do direito tenha se dado por necessidade da administração.
Decisão
O relator do processo, conselheiro Augustinho Zucchi, lembrou que a concessão de férias é direito social, garantido pela Constituição Federal, estendido aos ocupantes de cargos públicos, nos termos do parágrafo 3º do artigo 39 do texto constitucional.
Zucchi ressaltou que, como as férias são um direito social e irrenunciável, o STF, ao julgar o RE nº 650898, entendeu que o parágrafo 4º do artigo 39 da CF/88 não é incompatível com o pagamento dos direitos delas decorrentes, que são o acréscimo de um terço de férias e indenização em caso de não fruição.
O conselheiro lembrou que há diversos acórdãos do TCE-PR que tangenciam o tema, especialmente em relação ao pagamento de indenização de direitos não fruídos como forma de se evitar o enriquecimento sem causa da administração. Assim, ele concluiu que é inegável o direito a férias acrescidas do terço constitucional, bem como o direito a indenização em caso de não fruição; mas destacou a necessidade de previsão legal em relação ao pagamento e ao momento em que a indenização passa a ser devida.
O relator afirmou que, conforme as disposições do Acórdão nº 4529/17 – Tribunal Pleno do TCE-PR, pode-se inferir que o direito às férias não decorre da decisão proferida pelo STF no RE nº 650898, mas da previsão em lei municipal.
Zucchi salientou que as férias devem ser gozadas; e a impossibilidade de fazê-lo por motivos relacionados à necessidade do trabalho, impõe a indenização, sob pena de enriquecimento sem causa da administração. Mas ele frisou que a indenização no curso do mandato contraria a lógica do motivo que a justifica, pois o direito à indenização decorre da impossibilidade de fruição.
Finalmente, o conselheiro lembrou que o subsídio de detentor de mandato eletivo deve observar o disposto no artigo 37, X, da CF/88, que impõe a reserva de lei específica para fixação de remuneração. Assim, ele concluiu que a instituição de vantagens financeiras deve se dar por meio de lei.
Os conselheiros aprovaram o voto parcialmente divergente do conselheiro Ivens Linhares, apresentado no julgamento do processo, por maioria absoluta, por meio da Sessão de Plenário Virtual nº 14/24 do Tribunal Pleno, concluída em 1º de agosto. O Acórdão nº 2361/24, no qual está expressa a decisão, foi disponibilizado em 9 de agosto, na edição nº 3.269 do Diário Eletrônico do TCE-PR. O trânsito em julgado da decisão ocorreu em 20 de agosto.
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