Era uma vez uma cachorrinha, de raça não definida, que vivia às margens do rio Paraná brincando com outros cães que habitavam o local, próximo à Ponte da Amizade, na fronteira entre Brasil e Paraguai.
Certo dia, Mãezinha, o nome da personagem dessa história, foi capturada por usuários de crack que passaram a dividir o mesmo espaço com os animais. Pior que isso, ela viu cães que dividiam o espaço com ela serem mortos, desossados e servirem de prato principal em “churrascos” improvisados promovidos pelos usuários da droga.
Presa pelos novos moradores, Mãezinha possivelmente seria a próxima a ser morta, mas foi resgatada a tempo e escapou da morte.
Quando agentes da PF (Polícia Federal) chegaram ao local, encontraram a cachorrinha abatida, como se não se alimentasse havia uma semana, e em meio a um cenário composto por restos de ossos e carne de cães em espetos improvisados no chão. Ela tremia de medo e fome, segundo relatos dos policiais.
A vida de Mãezinha mudou quando agentes da PF foram a um antigo estaleiro, ao lado do local em que ela estava apreendida, para analisarem mudanças necessárias no espaço para abrigar uma base naval da corporação.
Ao verem a cena, os agentes levaram alimento e água, a batizaram e a adotaram, de acordo com Celso Calori, 59, subchefe do Nepom (Núcleo Especial de Polícia Marítima), da PF. O núcleo é responsável pela fiscalização do rio Paraná e do lago de Itaipu, para evitar a entrada de produtos contrabandeados em solo brasileiro.
“Hoje ela faz parte do nosso efetivo. Havia outros problemas quando a encontramos também, como o sumiço de patos e outros animais que habitavam uma chácara vizinha. Depois da chegada da base, o dono resolveu criar 700 galinhas no local”, disse Calori.
Além dos usuários de crack, animais também foram levados por contrabandistas paraguaios que chegavam à margem brasileira do rio para descarregar mercadorias.
NOVOS ARES
Inaugurada no final do ano passado, pouco após o resgate da cachorrinha, a base do Nepom fez com que todo o entorno fosse repaginado.
Pescadores, que eram alvos frequentes de tiros disparados por contrabandistas paraguaios –para assustá-los e fazerem com que deixassem o local para barcos com mercadorias atravessarem o rio–, voltaram a ficar às margens do Paraná a partir da chegada da base.
O local ainda ganhou neste mês passeios em um catamarã com capacidade para transportar 250 pessoas, inclusive à noite.
Já os usuários de crack desapareceram do local. Nenhum cãozinho foi encontrado morto nas redondezas a partir da implantação.
E Mãezinha passou por duas gestações: filhotes foram levados por agentes para virarem mascotes em outras bases da PF na região de Foz do Iguaçu.
Desde então, ela vive feliz no mesmo local em que provavelmente passou seus dias mais tristes.
MATÉRIA DA FOLHA DE SÃO PAULO – EDIÇÃO DO DIA 06/12/17
PUBLICAÇÃO/OGAZETEIRO – ÀS 07:11 – 06/12/17